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Por: Redação, com informações da BBC News Brasil
A Faixa de Gaza vive, neste momento, o que especialistas classificam como "o pior cenário possível de fome". O alerta foi emitido pela Classificação Integrada de Fases da Segurança Alimentar (IPC, na sigla em inglês), uma revisão técnica apoiada pela ONU, que afirma que os limites para caracterizar uma situação de fome já foram ultrapassados em diversas áreas da região, especialmente na Cidade de Gaza.
Segundo o documento, a fome generalizada, a desnutrição aguda e doenças ligadas à escassez de alimentos estão aumentando o número de mortes relacionadas à crise humanitária no território. A avaliação reforça que a única maneira de evitar mais tragédias é por meio de uma ação urgente: o fim das hostilidades e a entrada massiva de ajuda humanitária, de forma rápida e sem impedimentos.
Situação Crítica se Agrava
Em maio de 2025, a IPC já havia alertado sobre o risco crítico enfrentado pelos cerca de 2,1 milhões de palestinos que vivem em Gaza. No entanto, o novo relatório aponta para uma deterioração acelerada:
A taxa de desnutrição na Cidade de Gaza saltou de 4,4% em maio para 16,5% em julho;
Dois quintos das mulheres grávidas ou lactantes estão em estado de desnutrição aguda;
O acesso a alimentos e serviços essenciais caiu a níveis sem precedentes;
A proporção de famílias em situação de fome extrema dobrou entre maio e julho;
O norte da Faixa de Gaza é descrito como uma "área de grande preocupação", embora faltem dados detalhados devido às dificuldades de acesso.
Impedimentos à Ajuda Humanitária
Apesar de declarações oficiais israelenses sobre a liberação de ajuda, organismos humanitários contestam essa versão. O relatório da IPC aponta que os corredores para distribuição de alimentos são longos, arriscados e de acesso desigual, especialmente nas regiões mais afetadas. Além disso, os pacotes distribuídos pela Gaza Humanitarian Foundation (GHF), grupo apoiado por Israel e pelos EUA, foram criticados por exigirem água e combustível para preparo — insumos escassos na região.
"A ajuda humanitária continua extremamente restrita devido a pedidos de acesso sendo repetidamente negados e a frequentes incidentes de segurança", afirma o relatório.
A ONU Pede Cessar-Fogo Imediato
A publicação do relatório provocou fortes reações de líderes das Nações Unidas:
António Guterres, secretário-geral da ONU: "A destruição total de Gaza é intolerável. Deve parar."
Tom Fletcher, chefe humanitário da ONU: "Precisamos entregar ajuda em uma escala muito, muito maior. Os próximos dias serão decisivos."
Ben Majekodunmi, da UNRWA: "Palavras de indignação já não bastam. É preciso ação imediata para cessar o fogo e conter a fome."
Apesar dos apelos, a crise permanece politicamente travada, com Israel e o Hamas trocando acusações sobre a responsabilidade pela situação. O primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, declarou que "não há fome em Gaza" e classificou as denúncias como "mentiras descaradas". O ministro das Relações Exteriores de Israel, Gideon Sa’ar, também negou os bloqueios e afirmou que Israel está facilitando a entrada de ajuda — mais de 200 caminhões teriam cruzado a fronteira em apenas um dia, segundo ele.
Entretanto, na prática, as condições locais dificultam a distribuição dos mantimentos e medicamentos. Além dos combates, há restrições severas de movimentação, deslocamentos forçados e falta de infraestrutura básica, o que compromete gravemente a segurança alimentar.
O Que Caracteriza Formalmente uma Fome?
A classificação formal de uma fome exige que três critérios sejam simultaneamente atendidos:
1. Pelo menos 20% das famílias estejam em situação de fome extrema;
2. Mais de 30% das crianças menores de cinco anos sofram de desnutrição aguda;
3. Ocorrência de duas mortes adultas ou quatro infantis a cada 10 mil pessoas por dia, causadas por fome ou desnutrição.
Embora muitos desses indicadores já estejam sendo observados em Gaza, a dificuldade de acesso impede a coleta completa dos dados necessários para a declaração oficial. Equipes como as do Médicos Sem Fronteiras e da ONG Ação Contra a Fome relatam que os bloqueios e os ataques tornam inviável realizar pesquisas de campo com precisão.
O alerta do IPC é um grito de socorro. Gaza vive hoje uma crise humanitária de proporções catastróficas, agravada pela escassez de alimentos, o colapso dos serviços básicos e o contínuo bloqueio à ajuda internacional. O tempo está se esgotando. Cada dia sem ação concreta representa mais vidas perdidas.
É urgente que a comunidade internacional atue de forma coordenada para garantir um cessar-fogo duradouro, a entrada irrestrita de ajuda e a proteção da população civil. A fome em Gaza não é uma possibilidade futura: é uma realidade que já está ceifando vidas.
Com reportagem de Giulia Granchi, da BBC News Brasil em Londres, e colaboração de Rushdi Abualouf (Istambul) e Jacqueline Howard (BBC News).
Adaptação e Otimização: Luiz Sérgio Castro
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